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O estado é
um substantivo masculino que deriva do latim Status. Já a expressão o “estado da nação” é quase como um
pleonasmo porque normalmente se confunde o “estado” com a “nação” quando, na
verdade, percebemos que a “nação” é o todo que inclui as partes. Já uma outra expressão
“ao estado a que chegámos” remete-nos para a responsabilidade do “estado” em
quase tudo o que de menos bom acontece.
Não querendo
meter "a foice em seara alheia” permito-me fazer um comentário geral sobre
o atual estado da nação, em particular, no que concerne ao desenvolvimento
regional e no acreditar dos recursos endógenos dos territórios de interior e na
forma como os podemos potenciar.
Nós temos a
fileira dos vinhos como um exemplo paradigmático dessa capacidade e desse
potencial. Acreditamos, estudamos e potenciamos os nossos recursos genéticos,
designadamente as nossas castas, a capacidade empírica e tecnológica das nossas
gentes e empresas que estamos a promover no mundo com uma estratégia de marketing
forte e concertada. Tudo isto assenta numa identidade exclusiva do nosso
património genético, na nossa cultura da vinha e do vinho que desenham a
diversidade das paisagens e do enoturismo, neste “recanto à beira mar
plantado”. É esta corrente que nasce no interior por entre vales e serras,
florestas e pastagens que chega aos grandes centros de uma forma evoluída e personalizada
para ajudar a promover o melhor que um País pode ter, a diversidade das suas
culturas traduzidas em produção, sentimento, criatividade e inovação.
Outros
sectores, como o da fileira dos queijos, deviam seguir este exemplo, mas para
isso seria preciso um apoio mais efectivo e uma estratégia concertada, buscando
sinergias e procurando deste modo a resolução de muitos dos seus problemas. A
dinamização destes sectores poderiam contribuir igualmente para a sustentabilidade
destes territórios, designadamente, através da prevenção dos incêndios nas
florestas. Mas aqui rapidamente percebemos que, de uma forma genérica, as ações
praticadas e a implementação dos programas e das estratégias do estado não vão
ao encontro das necessidades nem daquilo que se apregoa. Na maioria dos casos
quando o fazem é em prol de uns poucos através de estruturas que têm canais de
acesso à informação e decisão privilegiadas. Não vamos voltar à conversa das
“camas dos animais”, mas os animais são, sem qualquer sombra de dúvida, fundamentais
para a salvaguarda, promoção e valorização do espaço rural e da floresta em
particular. Os animais são os primeiros “sapadores da floresta”, sendo que não
retiram mérito nem substituem os grupos de sapadores florestais que são
fundamentais para o delineamento e execução de planos de prevenção. Estes são
muitas vezes difíceis de justificar, porque não se tem a noção da estimativa do
risco e a exata quantificação dos prejuízos no pós trauma.
Uma outra
questão tem a ver com a valorização dos recursos da floresta, para que se
possam ir retirando dividendos “palpáveis” ao longo dos anos. Aí, a inovação
aliada ao setor técnico-científico tem um papel relevante a desempenhar, onde
os Institutos Politécnicos em parceria com os principais Centros de
Investigação e Desenvolvimento devem colaborar activamente. A proximidade geográfica
e o conhecimento técnico e prático de uns e a capacidade científica e
tecnológica de outros são uma simbiose estratégica fundamental que só pode
redundar em êxito, através de uma escolha criteriosa de investigadores e dos
respetivos consórcios.
O debate actual
do Estado da Nação não pode fugir aos últimos e trágicos acontecimentos de
Pedrógão Grande que “puseram a nu” algumas das fragilidades da atual política
do desenvolvimento do interior pela qual eu não ponho as “mãos no fogo”.
Obviamente que temos casos de sucesso, mas infelizmente são ainda poucos e “uma
árvore não faz a floresta”.
Eu assisto à
análise das candidaturas de projectos e vejo a falta de sensibilidade dos
decisores, a reduzida massa crítica tecnicamente válida para ocupar cargos
políticos neste interior e que normalmente se assumem como meras extensões das estratégias
decididas na capital. E se por alguma vez quiserem ter um “rasgo de lucidez” para
agitar um status quo, rapidamente
moderam o ímpeto e colocam toda a veemência no vibrar da haste da bandeira que
ostentam.
Para
decidirmos o rumo destes territórios, precisamos conhecer muito bem a geografia
e as suas gentes. Buscar identidades e diversidade para que os territórios no
seu conjunto actuem em sinergia e de forma concertada, através de planos
perfeitamente adaptados a cada realidade e que não se apliquem apenas
estratégias replicadas e decalcadas. O País é pequeno em escala, mas contém uma
diversidade paisagística, cultural e social que merece ser avaliada, valorizada
e promovida com os tais empreendedores que muitas vezes fazem a diferença em
absoluta consonância com as gentes que aí.
A estratégia
tem que partir do cerne, mas para isso temos que eleger quem o conhece na sua
essência e não pode ser vistos por “drone” como se todos tivessem floresta,
rios, paisagens, artesanato, gastronomia e pessoas. A diferença está na cultura
e nas gentes que os moldaram e que saberão seguramente os melhores caminhos
para o seu sucesso futuro. Obviamente que não o fazem sozinhos, mas têm que ser
os atores principais.
No pós
Pedrógão Grande parece que o interior e as suas populações são um problema e que
nada acrescentam a uma nação. O País ia tão bem embalado com um crescimento há
muito não atingido, muito por força do turismo, e eis que de repente se abateu
o demónio, com a “voz de uma trovoada seca”.
Este tipo de
crescimento tem que ser analisado com o devido cuidado, para que não estejamos
a acentuar uma dicotomia entre grandes centros e espaço rural. Obviamente que
os atores do espaço rural têm que se afirmar, mas as regras e as oportunidade têm
que ser claras e iguais para todos. Os produtores têm que fazer chegar os
seus primores aos grandes centros e pelas vias certas. Talvez a melhor forma de
os promover não seja pela mão dos chefs Michelin que palmilham quilómetros à
busca de obterem os seus rendimentos e reconhecimento. Já temos exemplos e
promessas bastas de ações e eventos, entre os quais o “Queijos à Chef” é um
exemplo, que não almejaram atingir os propósitos a que se propuseram.
Uma das
estratégias alternativas pode ser aproveitar o sucesso de algumas estruturas e
empresas do interior que, fruto de muito trabalho e empreendedorismo,
encontraram os canais certos de promoção e que hoje ganharam um capital e
reconhecimento nos grandes centros que permitem abrir portas a outros que
cumpram os mesmos requisitos de qualidade e que demonstrem essa vontade. O
futuro passa por atrair visitas mas no imediato temos que ir onde está o
turismo, tirar partido dos milhões de visitantes e ficarmos com o nosso "quinhão"
para trazer para cá e redistribuir nos territórios de interior e o exemplo da
Chocolateria Delícia pode ser um excelente "abre olhos", porque
acredito poderem e quererem ajudar outros que tenham uma qualidade irrepreensível
e o mereçam.
Paulo Barracosa
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