As três espécies,
o Carvalho-alvarinho (Quercus robur L.; Fam. Fagaceae), a Faia-europeia
(Fagus sylvatica L.; Fagacee) e a Tília-prateada (Tilia tomentosa
Moench.; Malvaceae), todas caducifólias, revelam o cerne da sua identidade,
porte e arquitetura quando desprovidas de folhagem. A vestimenta, curiosamente,
é muito biodiversa em formas, tons e matizes o que exalta a identidade de cada
espécie.
Comecemos pela
taxonomia e o que nos dizem as famílias e os seus apelidos. A família Fagaceae
inclui algumas das mais importantes plantas lenhosas do Hemisfério Norte,
constituindo uma das fontes mais importantes de alimento para a vida selvagem (sylvatica)
nas regiões de floresta temperada da Eurásia. O epíteto específico “robur”,
do carvalho, apelida a robustez que ostenta cuja arquitetura erige uma árvore
máscula e majestosa. A Tília, que se
assume como um dos ex-libris da cidade de Viseu, apelido como Afrodite arbórea,
pelo senso de simetria e todo o desvelo que coloca na toilette, sendo uma das
árvores de eleição do Mestre Aquilino Ribeiro que, as plantou no seu pátio
beirão e que, privilegiadamente e sentimentalmente, as admirou e descreveu.
A
dendrocronologia, representa o ramo da ciência que se dedica ao estudo da
datação dos anéis de crescimento e, etimologicamente, vem do grego, “dendros”,
que significa árvore, “cronos”, que expressa tempo e “logos” que se refere a
ciência. Quando observamos um corte transversal de uma árvore, é possível notar
que ela possui círculos concêntricos denominados anéis de crescimento que
resultam da atividade de crescimento do câmbio vascular. Um anel de crescimento
típico possui duas partes distintas. O lenho primaveril, com uma coloração mais
clara, que representa o crescimento do início do período vegetativo,
normalmente na primavera. O lenho outonal, representa o fim do período
vegetativo, geralmente no outono e, normalmente, apresenta uma coloração mais
escura. A formação de um anel de crescimento típico é mais comum em árvores que
crescem em locais com estações do ano bem definidas, como as regiões
temperadas. Já em regiões tropicais e subtropicais essa diferenciação é menos
definida. Fatores bióticos, abióticos, antropogénicos e outros podem afetar o
crescimento de uma árvore e ficam indelevelmente gravados no seu cerne como uma
fita do tempo de uma qualquer cassete que começa no umbigo, mas que irradia
para a floresta.
A experiência de 25
anos a conviver e avaliar o estado fitossanitário das árvores da cidade de
Viseu, permite-nos indagar sobre as causas que permitiram estarmos aqui a
admirar a simbiose entre a componente científica de uma anatomia arbórea e a
inspiração artística da Marisa Benjamim. Para memória póstuma das árvores considerámos
parâmetros dendrométricos e aspetos da biomecânica das árvores através da
realização de sondagens com um resistógrafo na extensão do diâmetro total do
tronco. Sabemos que os elementos
arbóreos do Carvalho-alvarinho derivam do exemplar majestoso que estava há
alguns séculos no parque Aquilino Ribeiro e que fomos monitorizando ao longo
dos anos até à sua queda, por causas naturais, fruto de um avançado estado de
degradação no tronco, em novembro de 2020.
A Tilia-prateada
proveniente do Fontelo, muito provavelmente, padeceu de um fenómeno típico
desta espécie que se apelida casca inclusa e ocorre em zonas de bifurcação com
uma ligação estrutural fraca, fruto de uma falha na consolidação, e que em
ramos de grande diâmetro aumenta a probabilidade de rutura.
Olhando com
pormenor o tronco do Carvalho-alvarinho no seu cerne apresenta-se
castanho-escuro de contorno regular e definido com o borne de tom
branco-amarelado. A anatomia revela camadas de crescimento distintas,
especialmente no cerne, pela variação destacada no diâmetro dos poros de outono
para os de primavera. Os vasos de primavera muito grandes, circulares a ovais,
solitários, de parede medianamente espessa e quase totalmente oclusos por
tilos, no cerne. Os de outono mais pequenos, de contorno mais ou menos
poligonal, formando bandas radiais que alargam, em leque, para a extremidade do
anel em crescimento. É uma madeira com uma densidade de 710 kg/m3 e
uma dureza alta com um cerne de boa durabilidade e o borne sensível.
A Faia-europeia de
cor amarelo-dourada, sem cerne distinto possui uma medula pequena com camadas
de crescimento visíveis e nítidas por tonalidades de cor. É uma madeira moderadamente pesada (675 kg/m3)
de secagem relativamente lenta e delicada pela forte anisotropia (fendimentos e
empenos). É particularmente sensível ao ataque de fungos cromogéneos e
lenhívoros, que se desenvolvem rapidamente no borne, muitas vezes ainda na
natureza. A Tilia-prateada apresenta uma
madeira amarela-rosada, sem cerne distinto. Apresenta camadas de crescimento
moderadamente distintas por uma linha de tecido mais claro ao nível da
separação de dois crescimentos contínuos cujas zonas de primavera e outono
apenas são notadas por ligeira variação de cor. Madeira muito leve (470 kg/m3),
dureza branda e textura muito suave e fraca. Revela uma secagem rápida e
elevada e possui vulnerabilidade ao ataque de fungos e insetos.
É sobre estes
materiais naturais com histórias e propriedades diversas que a artista plástica
Marisa Benjamim criou a sua perspetiva “Resilient Gardens”, traduzindo em arte
a cronologia gravada no cerne destes exemplares que refletem a memória dos
jardins e parques da cidade Viseu, apelidada Cidade-Jardim das Beiras.
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