Hoje ousei escrever sobre a experiência de estar tão longe de poder
privar com o Fernando Alves (FA) e de ter estado tão perto do meu paraíso, num Portugal
que de lés a lés é tão rico e variado que não será fácil encontrar em outras
geografias este tamanho de gente. Relembro que esta história começa algures por
2010, mais precisamente a 23 de fevereiro, quando surge uma vontade intrínseca
de escrever pequenas crónicas num blogue que apelidei por Biogere e cujo
primeiro título foi “O Queijo como ícone das Beiras” e que começa assim … “O
Queijo foi eleito o produto de referência para iniciar a atividade deste fórum.
A razão é simples, constitui na nossa opinião um dos expoentes que deriva das
características e qualidades ímpares da paisagem e dos recursos naturais e
endógenos das Beiras.”
Para alguém que não é um escritor nato e cujo mundo que conhece por via do
sentir é limitado, resta-lhe atentar aos pormenores do dia a dia e às coisas
simples da vida que podem ser tema de análise e interpretação. Procuro não ser radical na análise e deixar dupla
interpretação nas entrelinhas quando a mensagem o pressupõe não por conveniência,
mas por convicção.
Por isso dei por mim, na altura, a olhar os mestres inspiradores como o FA,
não para copiar, mas para inspirar e ajudar a respirar o palpitar do
pensamento. No dia 27 de abril de 2011, escrevi, uma das primeiras crónicas em
que referencio o FA. Mas que dia é este! Faz agora precisamente 13 anos, exatamente
no dia em que passou na antena 1 a nossa conversa sobre o cardo máximo no
programa “Tão Longe e Tão Perto”. E o que referi na altura “Religiosamente,
atraso o "passo", não para chegar ao serviço às nove em ponto, mas
para ouvir os sinais do Fernando Alves e por vezes buscar inspiração para a
crónica matinal. Hoje, invariavelmente, vinha com a crónica na cabeça. Mas o FA
também tinha escutado o mesmo pavão que eu ouvira ontem no decorrer da
entrevista ao primeiro ministro José Sócrates. Aliás, ao que parece até o
Carrilho havia escutado! E eu que ingenuamente pensara que tinha um pavão ou
uma "ave" afim no quintal lá de casa. Ele há sinais que... valem mais
do que mil palavras!”.
Quando admiramos e veneramos os nossos Mestres os pensamentos podem-se encontrar
e confundir com facilidade. Quiçá como os casais que se vão assemelhando, no
conteúdo e até na forma, ao longo do tempo de convívio e partilha. Daí a 29 de
setembro de 2011 escrevia sob o título “Sinais…da crise…mas também de
oportunidade…Tenho uma enorme sintonia de
pensamento com os sinais do Fernando Alves. Ontem, falava com uma colega
sobre o "surrupianço" do prémio de mérito aos alunos do secundário e,
eis que os "sinais" falaram. São estes pequenos sinais dos ministros,
agora deste, outra vez de outros, que nos põem a pensar que os cortes não são
"cegos", são "cirúrgicos" e amputam algumas das poucas
meritocracias ainda existentes….”.
Mais tarde a 12 de novembro de 2013, sob o título “Há sinais que interessam”…
faço referência à primeira vez que ouvi a referência ao Queijo Serra da Estrela
nos Sinais curiosamente numa série de programas que estava a ser transmitida de
Natal . “Os sinais do Fernando Alves são um dos
motes de inspiração. Sempre que posso ouço as crónicas, ditas com os tempos e
os ecos do Fernando que me deixam a pensar. Esta série está a ser transmitida
de Natal, no Brasil e ele fez referência ao Queijo Serra da Estrela e do estudo
de uma brasileira, Adriana Lucena à volta deste ícone. Vamos seguir este
impulso e contactar esta advogada, cozinheira de vocação que estudou 4 anos o
queijo Serra da Estrela. Depois contamos....”.
Continuamos por 2017 com uma crónica… “A natureza pensa em tudo...e coloca
à mão de semear!” … Atualmente queixamo-nos muito das alterações climáticas e de outros
problemas do foro ambiental e ecológico, criados quase exclusivamente por obra
e graça da espécie humana. É óbvio que habitam outras espécies no planeta, mas
até o hipopótamo, com toda aquela corpulência parece que tem pezinhos de
veludo. Por isso, não terá sido por acaso que este "cavalo do rio"
foi escolhido para coqueluche do Continente e também não foi por acaso que hoje
o Fernando Alves, o tenha referiu no seu "Sinais" a propósito dos hipopótamos
de Mário Vargas Llosa que considerava animais dóceis, de pele macia que apenas
ingerem libélulas (sendo herbívoros) e que adoram espojarem-se na lama e fazer
amor…”
O FA faz este exercício por respeito ao seu perfil jornalístico, indissociável
da pessoa, aos seus pares que com ele formam uma equipa e aos portugueses disseminados
no interior profundo, esses nos quais acreditamos e onde é crucial perpetuar
saberes, recriar tradições e recuperar “credos” nos territórios, de essência
natura e potencial biotecnológico.
Faltava eleger o cenário da gravação, o local e os participantes. O espaço
natural seria a ESAV, mesmo no meio da cidade de Viseu. Contudo, tratava-se de
um programa de rádio onde o som é o principal meio condutor, devendo ser
imaculado, e infelizmente no meio dos cardos como o FA pretendia sentiríamos o
eco da circulação automóvel como eu havia testado uns dias antes, mesmo no
começo da manhã. Por isso, a Quinta da Alameda foi, naturalmente, o local de
eleição porque tínhamos o cardo, os pássaros e ainda pelo facto deste ano
estarmos a realizar um ensaio numa parcela de vinha “Touriga-nacional” com
aplicação de um extrato de cardo no tratamento fitossanitário preventivo sob a orientação
técnica da Sónia Rebelo, responsável vitivinícola da Quinta da Alameda. Mas
gostaríamos de surpreender o FA com uma mesa de atributos do cardo e voltamos a
eleger os alunos do curso profissional de restauração da Escola Mariana Seixas orientados
pelo Professor Nélson Augusto na preparação, confeção e serviço de mesa ao
nosso ilustre convidado. Neste caso vieram acompanhados dos alunos de comunicação
e fotografia que fizeram a reportagem e respeitaram o pedido do FA para apenas
a divulgarem nos pós programa. Este é um aspeto curioso, num tempo de
imediatismo e mediatismo, em que antes de o ser já era, sabermos esperar pelo
tempo e pela surpresa do que será que aí vem desta vez é uma virtude!
Estava tudo a postos para o início da conversa, eis que ainda a digerir e transtornado pela derrota do Benfica do dia anterior frente ao Marselha, o FA percebeu que havia deixado descarregar o seu fiel amigo gravador de uma vida que era o cerne deste momento e sobre o qual iria ficar registado todo o ambiente e conteúdo que conseguíssemos expressar num momento de inspiração e naturalidade, tal como os anéis da árvore onde estávamos sob o copado na sua sombra. As opções seriam mudar toda a mesa para junto de uma ficha colada a uma parede ou carregar, novamente, o gravador enquanto ganhávamos inspiração para o momento. A ficha recaiu sobre a segunda opção, como que dando a oportunidade de podermos confraternizar um tempo extra e contarmos histórias que não viriam no programa. Esse aliás era o receio do FA que estivéssemos a perder a riqueza do programa porque já pareceriam histórias “requentadas”. Tivemos esse cuidado, também porque o FA trazia o seu roteiro bem estudado, na forma e no conteúdo com que me iria surpreender em direto. A história que merece ser contada é a do Manuel Paraíso que em 1998 se sentiu inspirado por uma crónica do FA sobre cogumelos silvestres na Mata da Margaraça e que desde então foi o mote para que o Manel fosse um dos maiores especialistas, por hobby, em cogumelos silvestres para além das urtigas, tomates e outros primores agrícolas e recursos endógenos. Não preparamos com antecedência, uma única questão, portámo-nos como jogadores profissionais sem sabermos ao início qual seria o resultado final e quase não houve recurso ao VAR para que numa qualquer montagem de uma qualquer linha condicionarmos o resultado final.
Neste interregno, por questões técnicas, pudemos degustar os primores
preparados pelos aluno(a)s sob a batuta do Nélson, o “Dry-Cardo”, as Cardeiras
dos Fumeiros D´Amaral, O vinho da APPACDM, a cerveja da Poliglota, e claro o
Queijo Serra da Estrela da Casa da Insua, o queijo fresco confecionado pelos meus
alunos da ESAV e da Escola Profissional de Tondela, e bolo podre de Castro
Daire e o pão de centeio e os cogumelos do cardo temperados com azeite da
Alameda. Na mesa estavam ainda as alcachofras que a Teresa havia encomendado ao
FA e nós por obra e graça o tivéssemos adivinhado. Chegados aqui podemos
começar o programa…
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