terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Não sei se já tenho memórias para ter Alzheimer,…


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O desafio lançado esta semana pela Mesa do Canto, foi falar acerca da doença de Alzheimer a qual me propus abordar ainda que de uma forma ligeira sob o cariz social, clínico e terapêutico. Esta temática obrigou-me a rever Still Alice, um filme que deu um óscar a Julianne Moore, no papel de Alice Howland. Alice revela o mesmo prefixo de Alzheimer e Howland é o nome de um atol localizado no oceano pacífico, a meio caminho de coisa nenhuma.
O título escolhido e que parece quase a “roçar a provocação”, veio de uma conversa de uma filha cujo Pai padecia de Alzheimer e que ela se questionava se estaria ou não preparada para sofrer de Alzheimer. A filha relatava que o seu Pai, que durante toda a sua vida tinha sido o seu herói e mentor, neste eclodir de vida, ela sentia que ele a amava como nunca a terá amado.
Eu nunca tive nenhum familiar próximo nem tenho lidado de perto com pessoas que padecessem de Alzheimer, o que me faz não saber em concreto o sofrimento dessas pessoas e dos seus e que posso às vezes ferir sem intenção aqueles que sofrem na pele dia a dia a perda das memórias, mas ganham de certeza afeto e sentimento, seguramente com muita paciência e dedicação.
Esta é uma doença emergente que afeta cerca de 40 milhões de pessoas e que se espera que venha a triplicar até 2050. Cada 3 segundos é diagnosticado um caso no mundo, um número que reflete que durante este programa da Mesa do Canto serão diagnosticados mais 20 casos, sem apelo nem agravo e que cada vez mais este número nos vai chegando mais próximo. Ora aqui está um exemplo que ser dos últimos é o melhor quando tantas vezes só queremos ser os primeiros.
Mais do que uma doença é um estigma que se abate não apenas sobre uma pessoa mas sobre uma família. Isto porque, numa percentagem ainda que pequena, trata-se de uma doença que se transmite hereditariamente através de um gene autossómico dominante (DIAD) e que por isso pode surgir precocemente na vida de uma pessoa.
Atualmente as doenças do foro cancerígeno servem como o melhor exemplo da evolução da ciência e da sensibilidade social para com uma das doenças que mais afeta a sociedade, mas também aquela sob a qual mais temos sabido procurar respostas e soluções. Por isso, há a tendência para estabelecer comparações e padrões. Provocando ambas igual número de óbitos, na doença de Alzheimer o investimento é cerca de 1/10 e os custos para a sociedade o dobro comparativamente com o cancro. A doença de Alzheimer, parece assim uma doença silenciosa e solitária e nas dez doenças que mais afetam a sociedade é aquela que ainda não tem qualquer perspetiva de cura, até que um dia a sociedade em uníssono acordo à séria para esta realidade. Mas esta impaciência já dura há mais de um século.
Esta doença foi identificada pela primeira vez em 1901, numa mulher de seu nome Auguste Deter falecida em 1906 com 51 anos de idade. O médico que a diagnosticou foi o alemão Alois Alzheimer que fatidicamente faleceu com os mesmos 51 anos, embora por complicações de uma doença viral.
As causas da sua origem estão identificadas e relacionadas com duas proteínas a B-amilóide e a proteína Tau. Há inúmeros grupos e estudos a serem desenvolvidos pelos mais diversos grupos de investigação em todo o mundo a procurarem soluções para atenuarem, prevenirem ou curarem aquilo que é uma doença e não apenas o resultado do envelhecimento. Há caminhos diversos para a cura que estão a ser trilhados, com base em fármacos, em plasma, estudados em minhocas, ratos e até macacos. Os prémios Nobel da Química do corrente ano desenvolveram a “máquina mais pequena do mundo”, uma máquina molecular que transforma energia química em força mecânica e movimento, uma solução que pode muito bem vir a ser aplicada no futuro, a par de terapias génicas entre outras imensas soluções. Um outro prémio Nobel, o da medicina, o Japonês Yoshinori Ohsumi, também estudou perturbações na regulação celular no que toca à autofagia, com o evoluir do envelhecimento. Os microtúbulos que estão igualmente envolvidos no desenvolvimento da ciência, também o estão nas doenças do foro cancerígeno e nós em Portugal temos investigadores brilhantes com o Prof. Doutor Hélder Maiato que os conhece como ninguém. Seguramente que mais cedo ou mais tarde vamos encontrar solução terapêutica para o Alzheimer, mas antes disso podemos fazer muito por evitarmos cair neste vazio.
Contudo, as causas reais ainda não estão alcançadas. Seguramente que o estilo de vida e a alimentação, a tal que Hipócrates dizia que era o nosso remédio, a poluição ambiental são as causas principais, para além de algumas genéticas. Há inclusivamente estudos, recentemente publicados, que relacionam casos de demência com a proximidade a grandes vias de comunicação.
As pessoas que padecem de Alzheimer, constituem no seu conjunto já a 18º Economia Mundial em termos de custo. E em termos de produtividade? Será que não conseguimos aproveitar todos estes recursos? Muitos foram brilhantes cientistas, outros brilhantes Pais e Mães. Que sociedade é esta que não os merece. Eu gostaria de ver arte e cultura representada, pintada e musicada realizada por estas pessoas em palcos de referência. Os maiores artistas do mundo têm mais do que comportamentos desinibidos, e são idolatrados por isso e até o próprio Presidente da maior Potência Mundial os tem e não é nenhum handicap.
Num estudo publicado na última revista da associação Alzheimer Portugal, pelo projeto UP65, constatamos um dado que nos põe a pensar. Apenas um em cada dez dos nossos idosos tem níveis regulares de Vitamina D, em Portugal, o tal país “à beira mar plantado” que é a síntese entre o mediterrâneo e o Atlântico de Orlando Ribeiro. Este devia ser o melhor de dois mundos, em termos de alimentação e clima e por acréscimo saúde e bem-estar e que nós continuamos a não saber valorizar e outros nos querem denegrir. Algo vai mal na forma como lidamos com o potencial do nosso País que queremos que outros usufruam e que não nos ensinamos a aproveitar e desfrutar.
Se algum conselho posso dar-vos é que apliquem muitas das políticas do pré-escolar de sociedades evoluídas na promoção do combate ao Alzheimer e na valorização dos pequenos feitos que todos somados são grandes feitos. Tratemos os nossos idosos com tanto carinho como tratamos os nossos pequeninos, não vamos perder nada, mas vamos ganhar quase tudo! E coloquemos os mais velhos em contacto com os mais novos. Uns e outros estão-se a formar e ambos se compreendem na perfeição…
No dia em que escrevia esta crónica, o filho de um Amigo sofreu um AVC, ....com 12 anos e que não posso de deixar escrever e fazer menção, porque é isto que nos tolhe e nos embarga a voz! Força!

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